segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Crônica de um menino pobre

Ele vai pelo pátio da escola. A passos curtos carrega uma sacola numa das mãos e na sacola sacos, de leite. Cortante como navalha a alça da sacola faz doer a fina pele de sua mãozinha, a outra ele levanta a meia altura para fazer contrapeso ao leite.
Cabisbaixo, só levanta sua cabecinha quando vê ao lado uma doce menina que caminha com sua mãe. Ela tem nas mãos o carinho que a acalma e não uma navalha. Ele se sentiu diferente. Pela navalha, pelo leite, pela roupa; por ele. Para uma criança, sentir-se diferente é qualquer coisa como uma dor que dói e de tanta dor não se é possível sentir...só um olhar é capaz de mostrá-la. O olharzinho dele mostrou. Ele ainda não entende o porquê da diferença, mas sente. Sente o leite e a sacola que faz cortar suas mãozinhas. Ele não a agüenta mais. Ele não se agüenta mais e vai explodir. De alguma maneira hoje ou amanhã o menino das mãozinhas que a sacola do leite fez doer irá exteriorizar o que desde muito cedo ele sentiu: a divisão de classes. A passos curtinhos ele ultrapassa o portão da escola e, na rua, coloca a sacola nos ombros...aliviou a dor das mãos, mas dificilmente apagará a dor do coraçãozinho que calado não entende o que vê, mas sente o que vive.

Alex Dancini

Nenhum comentário:

Postar um comentário