segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Homem primata, capitalismo selvagem

Assistir a uma peça de teatro é para a maioria dos trabalhadores algo muito próximo do impossível. Vivemos numa sociedade em que os proprietários dos meios de produção buscam a todo momento aumentar seus lucros, para assim aumentar seu capital financeiro. Para aumentar os lucros é necessário mais trabalho humano, e muitas vezes, mais trabalho humano não significa mais indivíduos trabalhando, mas sim, o aumento da jornada de trabalho daqueles que já ocupam os postos de trabalho. Nesse sentido, um trabalhador chega a trabalhar de 10 à 12 horas por dia num rítmo acelerado, já que quanto mais produz mais o patrão ganha e menos chance tem o operário de perder seu emprego. Assim, não sobra tempo e tampouco coragem para o trabalhador assistir atentamente a um espetáculo de teatro (para não falar na falta de grana). O ser humano é uma máquina. Máquina de produzir lucros. Sobrevive com aquilo que os donos do capital calculam que seja necessário para que ele tenha forças para produzir. Nada mais. O resto é supérfluo.
O lazer e o prazer de "ser humano" não existe para o trabalhador no modo de produção capitalista. Desse modo, o sentido de vida de um trabalhador se resume em trabalhar (vender sua força de trabalho) para alguém. Se não tem trabalho, perde-se o sentido de viver e matar ou morrer é apenas um detalhe.
E é justamente por essa  e outras razões que não medimos esforços para levar um pouco de lazer e prazer a trabalhadores e filhos de trabalhadores de diversos cantos do Paraná.
A Oficina de Teatro Popular, sob a responsabilidade do oficineiro Márcio Pessati, levou o encanto que envolve um personagem e sua interpretação, o encanto das cortinas que se abrem e fecham na frente do palco e o encanto da poesia que há muito ou nunca tinha chegado aos ouvidos e aos olhos do lavrador de calos na  mão. Nem mesmo a jovem menina que todos os dias às 5:30 da manhã se levanta para tirar o leite. E tampouco à zeladora da escola rural, que é educadora, mas está excluída da arte que torna o ser humano mais sensível e mais humano.

Que vale ao intelectual seus conhecimentos se não consegue perceber a simplicidade do ser humano. No capitalismo, o simples se torna ausente, porque precisamos sempre nos atualizar com o novo que nos parece complexo, e nos relacionamos com o outro por meio do novo, as relações sociais se tornam complexas, são difíceis de entender. Como não há tempo para entender, dançamos conforme a música e não nos relacionamos com o outro, estabelecemos sim, uma luta constante em que só há um perdedor: o ser humano.
A música que embala essa dança pode ser esta: " homem primata, capitalismo selvagem...ôôô"

Alex Dancini

Bela experiência



Lindoeste, pequena cidade próxima a Cascavel. A base econômica do município é a produção agrícola dos vários assentamentos do MST, inclusive, a do assentamento Vitória, o qual tive o prazer de visitar e conversar com alguns assentados. Juntamente com os camaradas Moisés e Márcio Pessati, assessores do Deputado Federal Dr. Rosinha (PT-PR), pude aprender um pouco mais sobre o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. Um assentamento que existe há 24 anos e que possibilitou a várias famílias satisfazer suas necessidades enquanto seres humanos se apropriando daquilo que produzem. A grande maioria das famílias mora em casas confortáveis (para o padrão popular, é claro), e se não estivessem ali, possivelmente, estariam aumentando a estatística das famílias que moram nos morros das grandes cidades e que a cada chuva são obrigadas a deixar suas casas (barracos) por motivo de segurança. Embora haja muita coisa em que o MST precisa avançar, não dá para negar a importância do Movimento no processo de reforma agrária no Brasil.

Crônica de um menino pobre

Ele vai pelo pátio da escola. A passos curtos carrega uma sacola numa das mãos e na sacola sacos, de leite. Cortante como navalha a alça da sacola faz doer a fina pele de sua mãozinha, a outra ele levanta a meia altura para fazer contrapeso ao leite.
Cabisbaixo, só levanta sua cabecinha quando vê ao lado uma doce menina que caminha com sua mãe. Ela tem nas mãos o carinho que a acalma e não uma navalha. Ele se sentiu diferente. Pela navalha, pelo leite, pela roupa; por ele. Para uma criança, sentir-se diferente é qualquer coisa como uma dor que dói e de tanta dor não se é possível sentir...só um olhar é capaz de mostrá-la. O olharzinho dele mostrou. Ele ainda não entende o porquê da diferença, mas sente. Sente o leite e a sacola que faz cortar suas mãozinhas. Ele não a agüenta mais. Ele não se agüenta mais e vai explodir. De alguma maneira hoje ou amanhã o menino das mãozinhas que a sacola do leite fez doer irá exteriorizar o que desde muito cedo ele sentiu: a divisão de classes. A passos curtinhos ele ultrapassa o portão da escola e, na rua, coloca a sacola nos ombros...aliviou a dor das mãos, mas dificilmente apagará a dor do coraçãozinho que calado não entende o que vê, mas sente o que vive.

Alex Dancini